Quebraram-se os velhos tabus e até mesmo a opressão
Silvia Bruno Securato
Dou início a este texto refletindo sobre a pergunta: você ama sua idade?
De imediato a resposta é negativa, pois preferia permanecer tal e qual eu era aos 40 anos, mas isso é impossível! Ter 40 anos com a sabedoria e a experiência que tenho hoje seria mais difícil ainda… é preciso viver para ter conhecimento. Só quem passa por vivências típicas e contínuas do amadurecimento é que pode avaliar e opinar nas questões relativas à nova maioridade.
A resposta mais apropriada para esta questão seria: amo ter a minha idade nestes tempos em que vivemos hoje! Porque no tempo da minha avó…
Cheguei ao ponto! Esta é a resposta certa.
Estou na casa dos 60 anos ativa e independente. Amo meu trabalho, amo criar, a moda jovial, a vida agitada, a minha família, ter a alegria de fazer as escolhas que mais me agradam, enfim… ser livre para viver intensamente!
Quebraram-se os velhos tabus e até mesmo a opressão.
Será que, por algum momento, minha avó, na mesma idade que eu, não tinha desejo de viver de outra maneira? Temos que levar em consideração que era “normal” manter a vida que ela levava, era o costume. Mas hoje eu penso: será que, no seu íntimo, ela não teria desejos e muita disposição para realizar algum tipo de sonho?
A sua vida era bastante regrada e trabalhosa. Entretanto, logo no início do dia, ela se arrumava, passava pó de arroz, um batom levinho, mantinha os cabelos grisalhos bem arrumados, cobria-se de joias, colocava um vestido bonito, sapatinhos de salto “Anabela” e iniciava sua rotina: cozinhar, servir o marido, cuidar das plantas e se divertir com os netos. Meus avós moravam com meus tios, que os mantinham como velhos que precisavam de cuidados.
As normas de vestimenta eram bem marcantes. Crianças se vestiam de uma maneira apropriada à sua idade; os jovens eram mais ousados. Adultos, em especial as mulheres casadas, eram bastante sóbrias, recatadas e, já aos 30 anos, colocavam-se na condição de senhoras rainhas do lar. Frequentavam casas de chá e nunca, jamais, uma mulher pediria um café em pé no balcão.
Entrar na casa dos 60 não muda o pensamento jovial de ninguém! Acredito que aos 80/90, a cabeça é a mesma, só o corpo é que fica mais lento. O espírito jovem permanece.
Neste caso, tenho lindas lembranças da minha bisavó, que foi mãe de 13 filhos. Ela cuidava pessoalmente de suas roupas íntimas e, quando íamos visitá-la, no interior de São Paulo, fazia questão de preparar o almoço – no fogão a lenha – e sua memória fantásti-ca não a deixava esquecer os pratos prediletos dos inúmeros netos que fariam parte da refeição. Sim, eram dezenas de netos e bisnetos – e até um tataraneto – e ela, cheia de energia e luz! A quase centenária era incansável e radiante.
Sabemos que existem pessoas que são velhas, acabadas desde a juventude… Isso sim. Sentem medos e vergonhas inconcebíveis.
São bem acomodadas por natureza. Conheci uma senhora que, após os 60, se acomodou totalmente. Após a viuvez, então, sua vida enlutou até os 90 anos, quando faleceu. Passou anos e anos sentada numa poltrona, resmungando, criando fantasmas e alucinações… Fazia questão de manter dezenas de remédios sobre a mesinha ao lado, bem expostos, para demonstrar o quanto era frágil! Não visitava os parentes, nem as amigas, e não participava mais dos compromissos em família porque tinha vergonha de ser viúva. Acabou brigando com todos e ficando sozinha, sem ter com quem conversar e, pior, criando confusão entre os membros da família, pois sua imaginação de que estava sempre sendo perseguida ou de que as pessoas só se aproximavam dela por interesse era muito fértil. Pobre senhora!
Enfim, existem velhos e idosos, ou seja, os ranzinzas acomodados e os curiosos, prontos para aprender e viver novas experiências. Pretendo seguir meus caminhos “subindo a montanha, com a mochila nas costas…”. Tenho muito sonhos e desejos para realizar e, quanto mais os conquisto, mais quero conquistar. Desejo chegar ao topo e fincar minha bandeira, deixando um bom exemplo, um lindo legado aos meus netos. Assim seja!
MARIN, Bete e PERROTTI, Edna (Org.), Amo minha Idade, Oficina do Livro Editora, São Paulo – SP, 2020